Банкир-анархист и другие рассказы | страница 83



Procurei-o e disse-lhe: «Bastos amigo, quero pintar o meu carro de gente. Quero pintá-lo de um esmalte que fique lá, com um esmalte fiel e indivorciável. Com que esmalte é que o hei-de pintar?»

«Com BERRYLOID», respondeu o Bastos, «e só uma criatura muito ignorante é que tem a necessidade de me vir aqui magar com uma pergunta a que respondería do mesmo modo o primeiro chauffeur que soubesse a diferença entre um automóvel e uma lata de sardinhas».

«Perfeitamente…»

«Com que é que você quer pintar um carro», continuou o Bastos sem me ligar importância, «senão com um esmalte que seja ao mesmo tempo brilhante e permanente? E, ainda por cima, fácil de aplicar… Isto do fácil de aplicar é comigo, mas é uma virtude, e as virtudes citam-se… Vá-se embora!..»

«Bom…», disse eu.

«Isto de esmaltes de nitrocelulose», prosseguiu o Bastos, dando-me um encontrão, «não é um assunto de mercearia a retalho. Tem uma coisa maçadora a que se chama ciência. Sabe o que é? Mas é maçadora para quem prepara as coisas; para nós, que as recebemos preparadas para as aplicarmos, é um alívio e uma alegría. Este BERRYLOID é produto de longos cuidados feito no primeiro laboratório de tintas, lacas e vernizes. Percebeu? Não é primeiro produto do género que apareceu, porque o ser primeiro está bem se se trata de estar numa bicha, mas não se se trata de tintas ou de coisas que metem estudo e provas. Não: nas tintas e na prática, a última palavra é que é a primeira».

«Meu caro Bastos…», disse eu.

«Só BERRYLOID», respondeu o Bastos, virando-me as costas.

«Eu quería agradecer…», prossegui.

«Traga o carro», disse o Bastos.

Levei-lhe o carro e ele pintou-o a BERRYLOID. E não há camurça, nem chuva, nem poeira da pior estrada, que consiga envergonhar esse esmalte de aço. Sim: o Bastos tratou-me mal, mas tratou bem a verdade. Não há nada como o BERRYLOID.

…Tanto assim que, quando comprei o meu segundo carro, tratei logo de saber se ele vinha já pintado a BERRYLOID. Ele aí está na base da página e no fim da minha história. Passa-se a camurça, mas é preciso usar óculos fumados: o brilho deslumbra. E, o que é mais, deslumbrará, porque dura.

A minha camurça dura eternamente. O que se tem gasto muito são os óculos fumados; e os elogios dos amigos que vêem os meus carros pintados a BERRYLOID.

Um grande português ou A origem do conto do vigário

Vivía, há já não poucos anos, algures num concelho do Ribatejo, um pequeno lavrador, e negociante de gado, chamado Manuel Peres Vigário.